O branqueamento ecológico e a defesa do consumidor

No discurso que o Presidente Kennedy fez ao Congresso, a 15 de março de 1962, a propósito da proteção dos consumidores, ganhou proeminência o direito à informação, caracterizado, em primeiro lugar, como o direito a ser protegido contra informação, publicidade, etiquetagem ou outras práticas comerciais falsas, fraudulentas ou enganadoras e, em segundo lugar, como o direito a conhecer todos os elementos necessários para uma escolha informada. O impacto do discurso foi de tal ordem que aquela data é internacionalmente celebrada como o dia dos direitos do consumidor e, num balanço retrospectivo, podemos afirmar que o seu conteúdo se mantém no essencial atual e adequado aos novos desafios e realidades.

Num contexto contemporâneo de circularidade da economia, que visa o acesso pelos consumidores a produtos de alta qualidade, funcionais, seguros e eficientes, que durem mais tempo e concebidos para a reutilização, a reparação e a reciclagem de alta qualidade, torna-se necessário garantir que os consumidores obtenham informações fiáveis e pertinentes, incluindo no que respeita à vida útil dos produtos e à disponibilidade de serviços de reparação, pelas sobressalentes e manuais de reparação. E necessário é também protegê-los do branqueamento ecológico estabelecendo requisitos mínimos para os rótulos e logótipos de sustentabilidade. Na verdade, as empresas recorrem cada vez mais, nas suas técnicas de marketing, a alegações ambientais (green claims), isto é, declarações ou informações veiculadas na comunicação comercial através das quais se sugere que um produto ou serviço reúne um conjunto de atributos que têm impacto positivo ou um impacto menos nocivo no ambiente. As alegações ambientais devem ser, designadamente, verdadeiras, precisas e susceptíveis de comprovação através de provas científicas, claras e explícitas, sobre a característica ambiental a que se referem, e comunicadas através de linguagem simples e acessível. A utilização de expressões como “Amigo do ambiente”, “Ecológico”, “Sustentável”, ou “Biodegradável”, deve ser sempre acompanhada das informações que expliquem e demonstrem que o produto ou serviço respeita a característica alegada, incluindo testes, estudos ou dados científicos. A alegação ambiental inverídica, pouco clara, vaga, irrelevante, exagerada ou não assente em dados cientificamente comprovados pode traduzir um branqueamento ecológico (greenwashing), violador do Código da Publicidade e ao Regime das Práticas Comerciais Desleais. O aumento significativo destes caso motivou a Direção-Geral do Consumidor e a Auto Regulação Publicitária a desenvolverem um guia explicativo sobre as práticas comerciais das empresas que associam as suas marcas ao tema da sustentabilidade (Guia sobre Alegações Ambientais na Comunicação Comercial), apresentando orientações destinadas aos operadores económicos, que visam sensibilizá-los para a adequada promoção dos seus bens e serviços sempre que recorram a alegações ambientais, por forma a não induzirem em erro os consumidores, e fornecendo informações destinadas aos consumidores com enfoque na temática das alegações ambientais utilizadas no marketing e na publicidade.

O propósito destas medidas reconduz-se, no seu núcleo essencial, àquela que é uma das funções básicas da política do consumidor: providenciar-lhe a informação necessária e adequada para o capacitar a tomar uma decisão o mais informada possível, que satisfaça os seus interesses privados e que seja simultaneamente socialmente comprometida.

Sandra Passarinhas – Diretora Executiva do Centro de Direito de Consumo da FDUC, in Diário As Beiras (14-03-2022)

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