As emergências do século XXI e a desorientação do Anthropos

 

O que liga estes três fenómenos – Alterações Climáticas, Guerra e Pandemia – é que todos são emergenciais. A questão é a de saber qual ou quais razões que conduzem as sociedades a hierarquizarem as emergências, isto é, a qual responder primeiro? As Alterações Climáticas podem sempre esperar? Não vou aqui procurar responder à questão, pretendo apenas acicatar as nossas mentes e sublinhar a importância de termos tempo para reflectir, caso contrário continuamos a responder às emergências, um tanto ou quanto alienados.

Em 2019 todos quisemos acreditar que a Covid 19 não chegaria a nós, portugueses – a própria Diretora Geral da Saúde o disse! Afinal a China é do outro lado do mundo! Pouco tempo foi preciso para se propagar mundialmente e pôr em causa as formas de organização social nas diversas escalas, expor as desigualdades que continuam a comandar o mundo e as suas lógicas e poderes: da indústria farmacêutica à lei do mais forte, económica e politicamente. As preocupações com as alterações climáticas foram/vão ocupando espaços pontuais neste panorama.

Discutiu-se aqui e ali a importância de combater o Aquecimento Global para se poder evitar que cenários pandémicos como este, que põem em causa os modelos de organização vigentes, se repitam futuramente. Talvez por isso a COP de Glasgow foi um falhanço total nos compromissos para uma acção colética face às Alterações Climáticas.

Mal o ano – e mesmo antes disso – começou, vimos a Rússia a ir-se movimentando em direcção à Ucrânia. Mas não, não nos devemos preocupar. O Sr. Putin disse que não ia atacar a Ucrânia!

Acabámos por acordar em choque com a Invasão da Ucrânia pela Rússia! Parece um pesadelo, uma qualquer ficção. Em pleno século XXI deflagra uma guerra – literalmente – na Europa? E desde esse dia a pandemia ‘acabou’?, é legítimo perguntarmos. E, com todas as emergências, as Alterações Climáticas, parecem ter ficado afastadas do centro da atenção internacional, apesar do IPCC alertar para o facto de que não se podem combatê-las com meios termos!

Os mass media que divulgam as preocupações sociais e políticas hodiernas, seguiram o caminho dos Estados que já tinham decretado o fim da pandemia. Os jornais praticamente já não transmitem os números de infetados e de mortos e as opiniões de peritos em saúde pública, epidemiologia ou de outros assuntos que se relacionem com a pandemia. Novos peritos e novas geografias invadem as nossas casas, onde continuamos a ver camas, mas agora de refugiados de guerra, mulheres e crianças são os mais recentes sem-terra que se juntam àqueles que procuram fugir da degradação ambiental e de outras Guerras, aquelas não ocidentais, à mistura com bombas, explosões e ameaças nucleares que podem acabar com isto tudo rapidamente.

Fica o silêncio ensurdecedor da falta de norte para a humanidade! Fica o desafio à reflexão!

Fátima Alves – Professora Universitária e Socióloga, in Diário As Beiras (05/03/2022)

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