Nas últimas semanas, o tema do acesso à habitação ganhou centralidade na agenda política do país e invadiu a discussão pública. É uma boa notícia que todos tenhamos voltado a discutir, com interesse, as escolhas que nos afetam a todos.
Contudo, o problema está longe de ser novo. Recorde-se que o primeiro diploma legal que institui uma política pública de habitação em Portugal foi o Decreto n.º 4137, de 25 de abril de 1918, e que dele constava a referência ao atraso nacional, relativamente a iniciativas do poder legislativo ou executivo de países como a Inglaterra, a França, a Alemanha, a Itália ou mesmo a Espanha, para o desenvolvimento das então designadas “casas económicas”.
Ao longo de mais de 100 anos de políticas públicas de habitação – magnificamente descritos, por exemplo, em “Habitação. Cem anos de políticas públicas em Portugal 1918-2018”, muito foi o caminho andado e as lições aprendidas.
Ora, de 2018, para cá, esse caminho acelerou-se, embora também se tenha agudizado a gravidade do problema na vida de muitos portugueses.
Com efeito, não só foi adotada, pelo Conselho de Ministros, uma Nova Geração de Políticas de Habitação, como foi aprovada, pela Assembleia da República, uma Lei de Bases da Habitação. Foi neste contexto, marcado pela passagem de uma política centrada na oferta pública de habitação aos mais carenciados, para uma política orientada para o acesso universal a uma habitação adequada, que foram desenhados instrumentos como o “1º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação”, o “Programa de Arrendamento Acessível” ou o “Programa Porta 65 Jovem”.Mas, por outro lado, ao rescaldo da crise da Zona Euro, somaram-se os impactos económicos da crise pandémica da Covid-19 e da guerra da Ucrânia, com os seus efeitos disruptivos nas cadeias de abastecimento e de produção, nos aumentos de preços de alimentos e energia, na inflação e nas taxas de juro, dos quais têm resultado agravadas dificuldades no acesso à habitação.
Não há respostas simples para problemas complexos e, por isso, o pacote “Mais Habitação” procurou combinar várias medidas, atuando em várias dimensões do problema.
O incentivo ao aumento do número de casas no mercado de arrendamento acessível é, provavelmente, o seu elemento central, porquanto para este concorrem medidas já promulgadas, como o apoio extraordinário à renda, mas também medidas ainda em circuito legislativo ou mesmo a discutir no Parlamento, como o estímulo a novos projetos privados para arrendamento acessível, a uma nova geração de cooperativas de habitação, à mobilização de devolutos públicos e privados, à transferência do mercado de alojamento local para o de arrendamento.
Sabendo-se que, segundo os Censos 2021, dos 5.974.719 alojamentos familiares clássicos existentes (+1.7% face a 2011, o que evidencia abrandamento do ritmo de crescimento do parque habitacional, que crescera 16.3% na década anterior), 69% eram residência habitual, 19% residência secundária e 12% se encontravam vagos (i.e., desocupados e disponíveis para venda, arrendamento ou demolição), a direcção escolhida para ser a correta.
Importa agora acelerar o passo.
Marta Temido, PS, in Diário As Beiras (04/04/2023)
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